PAPAS E FÁTIMA

 

A relação dos Papas com Fátima tem ganho uma visibilidade maior desde as viagens pontifícias realizadas por Paulo VI e, sobretudo, por João Paulo II. Mas já antes o bispo de Roma manifestava o interesse pelo acontecimento e, sobretudo, pela mensagem deixada pela Virgem Maria na Cova da Iria.

 

Pio XI

A primeira referência conhecida data de 9 de janeiro de 1929, dia em que Pio XI recebeu em audiência os alunos do Pontifício Colégio Português de Roma. No final do encontro, leu em português a invocação de uma pagela (“Madre Clementíssima – Salvai Portugal”), referindo ter recebido as estampas naquele mesmo dia, vindas de Portugal, distribuindo-as pelos alunos.

As estampas, com a imagem de Nossa Senhora de Fátima, tinham sido impressas pelo Apostolado da Oração e exibiam o imprimatur do bispo de Leiria, D. José Alves Correia da Silva, datado de 17 de maio de 1926.

Ainda em 1929, em 6 de dezembro, o Papa Pio XI benzeu uma imagem de Nossa Senhora de Fátima destinada àquele Colégio.

A imagem, assinale-se, tinha sido esculpida pelo mesmo autor daquela que se encontra na Capelinha das Aparições, José Ferreira Thedim.

Em 1 de outubro de 1930, o Papa Pio XI concede indulgências plenárias aos peregrinos de Nossa Senhora de Fátima.

De acordo com o jornal Voz da Fátima de 13 de novembro desse ano, é concedida uma indulgência «de sete anos e sete quarentenas a todo o fiel cristão – contrito de suas faltas – todas as vezes que visitar o Santuário e aí rezar segundo as intenções do Sumo Pontífice».

É ainda atribuída uma indulgência plenária – uma vez por mês – aos peregrinos que em grupo se desloquem ao Santuário e aí rezem igualmente pelas intenções do Santo Padre.

Sublinhe-se que estes três atos aconteceram antes da publicação da Carta Pastoral do bispo de Leiria, na qual se consideram «dignas de crédito» as Aparições de Nossa Senhora relatadas pelos três Pastorinhos, que só veio a ocorrer em 13 de outubro de 1930.

Do seu antecessor, Bento XV, Papa na época das Aparições, não há memória de manifestações oficiais relativamente a Fátima.

 

Pio XII

A primeira posição oficial pública do Vaticano sobre Fátima acontece com Pio XII, em 31 de outubro de 1942, 25 anos depois das Aparições: nessa data, em plena II Guerra Mundial, o Papa consagra o mundo ao Imaculado Coração de Maria, acedendo aos pedidos de Nossa Senhora transmitidos aos três Pastorinhos de Fátima.

Quatro anos depois, em 13 de maio de 1946, envia o cardeal Aloisi Masella a Fátima para coroar a imagem de Nossa Senhora. Nessas duas ocasiões, Pio XII dirige mensagens, através da rádio, em português, aos peregrinos que acorreram à «montanha santa de Fátima» para depositar aos pés da Virgem Padroeira «o tributo filial» do seu amor: «Rainha do Santíssimo Rosário, Refúgio do género humano, nós confiamos, entregamos, consagramos, não só a Santa Igreja, Corpo místico do Vosso Jesus, mas também todo o mundo», referiu.

 

João XXIII

Quanto a João XXIII, regista-se a sua presença em Fátima, ainda enquanto Patriarca de Veneza, antes de suceder a Pio XII, em 13 de maio de 1956, agradecendo, mais tarde, à Virgem o convite para o que designou de «festim de misericórdia e de amor».

Após a morte do bom Papa João, como ficou conhecido, o bispo de Leiria, D. João Pereira Venâncio, em junho de 1963, solicitou ao Vaticano uma “relíquia-recordação” do Sumo Pontífice que convocou o Concílio Vaticano II.

A Secretaria de Estado do Vaticano acedeu ao pedido e enviou, em 6 de julho, a cruz peitoral de João XXIII. Segundo a Voz da Fátima de 13 de setembro de 1963, tratava-se de uma cruz de ouro que o então bispo Angelo Roncalli comprara quando desempenhara funções de Núncio no Oriente. A cruz está guardada no Museu do Santuário de Fátima.

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Paulo VI

O primeiro Papa a visitar Fátima foi Paulo VI, em 13 de maio de 1967, para assinalar os 50 anos das Aparições de Fátima e, simultaneamente, o 25.º aniversário da consagração do mundo ao Imaculado Coração de Maria.

Paulo VI veio, como «peregrino humilde e confiante», apenas a Fátima, a convite dos bispos portugueses, uma solução diplomática para evitar que uma sua visita a Portugal significasse o reconhecimento do regime do Estado Novo.

Nessa altura, existia alguma tensão entre Lisboa e o Vaticano, depois de o Papa ter participado, em dezembro de 1964, no Congresso Eucarístico Internacional em Bombaim, integrado numa peregrinação à Índia, apenas três anos depois de o exército indiano ter invadido e retomado Goa, Damão e Diu.

Na visita, a que se associaram em Fátima o Presidente da República, Almirante Américo Tomás, e o Presidente do Conselho, Oliveira Salazar, foi possível ver em público, pela primeira vez desde a sua entrada na clausura do Carmelo de Coimbra, a Irmã Lúcia de Jesus.

 

João Paulo I

Dos 33 dias de papado de João Paulo I não há registo de qualquer posição relativamente a Fátima, mas enquanto Patriarca de Veneza, o cardeal Albino Luciani esteve em Fátima em 10 de julho de 1977, cerca de um ano antes de ter sido eleito Papa (26 de agosto de 1978), presidindo a uma peregrinação de cerca de 50 italianos da região veneziana.

Segundo o relato do jornal Voz da Fátima, o cardeal recordou a presença anterior de João XXIII em Fátima, também enquanto Patriarca de Veneza, e, na breve saudação aos peregrinos, apelou ao cumprimento da Mensagem de Fátima – penitência e oração, especialmente a recitação do terço – e à observância do Evangelho.

No dia seguinte, o futuro João Paulo I teve um encontro no Carmelo de Coimbra com a Irmã Lúcia.

 

 

João Paulo II

É com João Paulo II, em 1981, que se desenvolvem e intensificam as relações de proximidade com a Fátima. Logo depois do atentado de que foi vítima, na Praça de S. Pedro, em Roma, em 13 de maio de 1981, o Papa atribuiu à proteção da Virgem de Fátima o facto de ter sobrevivido aos tiros disparados pelo turco Ali Agca.D0000400.jpg

Um ano depois, desloca-se a Portugal, tendo Fátima como alvo principal da visita, com o objetivo de «agradecer à Divina Providência neste lugar que a mãe de Deus parece ter escolhido de modo tão particular».

Na noite de 12 de maio, volta a ser alvo de um atentado, quando o ex-sacerdote integrista Juan Fernandez Khron tenta atingir o Papa com uma faca, não o conseguindo por intervenção de um dos polícias portugueses que escoltava o Sumo Pontífice.

Dois anos depois, em 1984, João Paulo II ofereceu ao Santuário de Fátima a bala que o atingiu no abdómen no atentado de Roma, projétil que em 1989 foi incrustado na coroa da imagem de Nossa Senhora.

A segunda viagem do Papa polaco a Portugal, em 1991, incluiu a participação na Vigília de Oração, em 12 de maio, e a celebração da Eucaristia no dia seguinte.

Na homilia, sublinhou a importância da Mensagem de Fátima para os tempos de hoje, caracterizando-a como uma espécie de eco das palavras de Jesus a Sua Mãe, no Gólgota, quando lhe entregou o discípulo amado. «Aqui Ela teve de os acolher a todos. Todos nós, homens deste século e da sua difícil e dramática história».

A terceira e última deslocação de João Paulo II, já com a saúde debilitada, ocorreu em 13 de maio de 2000, com o objetivo de presidir à celebração de beatificação de Francisco e Jacinta Marto.

Esta foi uma viagem feita por insistência do Papa, que obrigou os serviços do Vaticano a desmarcarem a celebração inicialmente prevista para o dia 9 de abril, na Praça de São Pedro, em Roma.

Outro sinal evidente da relação muito próxima que manteve sempre com Fátima foi a revelação da terceira parte do Segredo de Fátima, feita em 13 de maio pelo Secretário de Estado do Vaticano, o cardeal Angelo Sodano.

O Segredo de Fátima é tido como núcleo fundamental da Mensagem de Fátima e refere-se às visões e palavras testemunhadas pelos Pastorinhos na aparição de Nossa Senhora a 13 de julho de 1917. O seu conteúdo foi redigido por Lúcia na década de 40. As duas primeiras partes (a visão do inferno e a devoção ao Imaculado Coração de Maria) foram dadas a conhecer em 1941; a terceira (a visão da Igreja peregrina e mártir e da cidade em ruínas), redigida em 1944, permaneceu sob reserva e foi revelada publicamente em Fátima no ano 2000.

A terceira parte do Segredo inclui precisamente a referência a um atentado contra a figura do Papa, tendo João Paulo II ligado essa revelação ao acontecimento de 13 de maio de 1981, em Roma, ao qual sobreviveu por – disse-o várias vezes – «uma mão materna» ter desviado a trajetória da bala.

 

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Bento XVI

Quando Bento XVI visitou o Santuário de Fátima, em 12 de maio de 2010, para assinalar o décimo aniversário da beatificação de Francisco e Jacinta Marto, o recinto não lhe era de todo desconhecido e muito menos o conteúdo da Mensagem de Fátima.

Já tinha estado em Fátima, como cardeal Joseph Ratzinger, a presidir às celebrações de 13 de outubro de 1996, mas a sua ligação é anterior: como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, tinha estudado as Aparições e a Mensagem de Nossa Senhora.

Em 13 de maio de 2007 enviou a Fátima, como Legado Pontifício, o cardeal Angelo Sodano, ex-Secretário de Estado, para presidir à abertura das celebrações do 90.º aniversário das Aparições, dirigindo uma mensagem em que sublinhava o valor da oração do Rosário, como Nossa Senhora tanto pedira aos três Pastorinhos.

Na noite de 12 de maio de 2010, Bento XVI esteve presente na Cova da Iria na bênção das velas e na oração do Santo Rosário e presidiu à Eucaristia do dia 13, durante a qual sublinhou que o exemplo de vida de Lúcia, Francisco e Jacinta «irradiou e se multiplicou em grupos sem conta» por todo o mundo.

«Possam os sete anos que nos separam do centenário das Aparições [2017] apressar o anunciado triunfo do Coração Imaculado de Maria, para glória da Santíssima Trindade», apelou ainda.

 

Francisco

Francisco será assim o quarto Papa a visitar Fátima, e a sua ligação ao local das Aparições começa desde logo no simbolismo do dia da sua eleição, em março de 2013: o dia 13, associado às Aparições. Uma ligação que se torna mais efetiva e visível dois meses depois, quando os bispos portugueses, a seu pedido, consagram o seu pontificado a Nossa Senhora, durante as celebrações de 13 de maio de 2013.

E, logo a seguir, em outubro (mês fortemente ligado a Fátima), igualmente a seu pedido, a Imagem de Nossa Senhora que se venera na Capelinha das Aparições esteve em Roma para o encerramento da Jornada Mariana promovida pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização no âmbito da celebração do Ano da Fé.

O desejo de ir a Fátima («tengo ganas de ir a Fátima») foi transmitido aos bispos portugueses a 7 de setembro de 2016, durante a visita ad limina.

A visita ad limina, versão abreviada de ad limina Apostolorum (aos túmulos dos Apóstolos, em Roma), consiste na obrigação de os bispos diocesanos de um país se deslocarem a Roma, de cinco em cinco anos, para apresentarem um relatório sobre a situação pastoral nas suas dioceses e refletirem com o Papa, ouvindo os seus conselhos e recomendações, bem como com outras instâncias do Vaticano.

A chegada de Francisco ao Santuário de Fátima, no dia 12 de maio, será também a concretização da intenção que tinha manifestado, em privado, a D. António Marto, bispo da diocese de Leiria-Fátima, em abril de 2015: se Deus lhe desse «vida e saúde», estaria na Cova da Iria para celebrar o Centenário das Aparições.

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